sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Cinzas

Ela tinha fogo nos olhos
Eles queimavam tudo o que ela sonhava
Era uma espécie de Midas às avessas
O que desejeva mais, virava cinzas ao seu contemplamento

Descobriu assim que a vida era efêmera
Em anagrama a vida “é mera fé”
O que mais importa é o que não se vê

Então ela fechou os olhos antes que pudesse a beleza contemplar
Antes que pudesse a magia estragar
Antes que as cinzas transformassem seu encantamento
Antes que mais uma vez se descobrisse infeliz

Seus olhos cerrados abriam as portas aos sentimentos
E ela os permitiu
Beirou o abismo de olhos fechados confiando no que sentia
Transgrediu regras, ultrapassou fronteiras do que conhecia
E seu sorriso a iluminou de forma que nem mais se lembrara das cinzas

Em um dado momento, no entanto
Seus pés descalços passaram a sentir o calor e ela caiu
E era alto, e frio, e nauseante
Ela caía sem flores no chão para o pouso
Ela caía sem os risos do palhaço que tropeça
Ela caía sem a graça da folha no outono
Ela caía sem a magia da pluma ao vento
Ela caía
E caía
E caía
Em si
Em cinzas

Sim, seus olhos novamente estavam abertos
A pregar-lhe mais uma peça
Quem sabe a última
Pois ela descobrira que não poderia contemplar com olhar
Nem com os ouvidos, o olfato, o tato
Tampouco com seu sexto sentido

Em tudo ela se enganava
E às cinzas sempre retornava
Recolheu-se do pó e se refez naquele instante
A mulher que não queria ser.

Nenhum comentário:

Postar um comentário